Capítulo 1 - Keysha



Capitulo 1 - Keysha


A batida era bacana; o clima underground a atraía... De tantas vezes que fora ao lugar se tornara conhecida: era Keysha, a hairpink. Seus cabelos rosas chamavam a atenção e muitos a admiravam, mas tudo o que ela queria era estar em outro lugar, longe de tudo aquilo que naquele momento era superficial. Todas aquelas luzes, aquelas pessoas, aquele ambiente escuro e todos aqueles momentos em que passara até hoje transformaram a moça de cabelos morenos chamada Keila em “Keysha”.
-Preciso sair daqui! – sussurrava Keysha no banheiro da boate.
E após cheirar a quinta carreira da noite, entre lágrimas e estando ofegante, se via presa mais uma vez naquele mundo. Ela então sai daquele lugar mal cheiroso e sorri ao encontrar suas amigas de baladas que a esperavam no meio da muvuca.
-Tá tudo bem, Keysha?
-Tá sim, eu to sempre bem! – fala Keysha ao puxar o ar com mais força por causa dos restígios de pó que ainda havia em suas narinas.
Seguiram de volta à pista, onde todos dançavam incessantemente. Keysha via tantos rostos e olhava para suas supostas amigas só para se sentir segura. Em seguida voltava os olhos para a multidão e pensava consigo mesmo:
-Não, ele não vem hoje...
Eis que surge na multidão Rody, com um sorriso no rosto. Ele avista Keysha e a abraça.
-Cadê o Erick? – pergunta Keysha.
-Ele tava agorinha com a gente, tava rolando uns pegas na 408 Norte. Claro que eu alucinei!
-Mas será que ele vem?
-Keysha, ele sempre vem.
-Ai, meu Deus!
Keysha olhou triste para as luzes que dançavam na boate e seguiu de volta para o banheiro.
-Tá tudo bem! Tá tudo bem! - Repetia ela diante do espelho.- Dessa vez vai dar certo.
Ao voltar, Erick já se encontrava na pista, dançando e conversando com uma garota, enquanto Rody pedia uma bebida. Keysha então se concentra e resolve encarnar uma personagem, afinal, o seu jeito deveria ser o mais ousado possível. Ela não se sentiria bem se fosse simples demais. Iria parecer caretona. A garota pega uma bebida e chega perto de seus amigos e de Erick.
-Oi, Erick! Eu atrapalho alguma coisa? – pergunta Keysha.
A garota, que estava ao lado de Erick, olha Keysha da cabeça aos pés com um certo desprezo e vira a cara.
-Não, não, de maneira alguma...você tá bem?
-Sim, tá tudo bem sim, e com você?
-Também...a noite foi longa, estávamos na 408 Norte.
A garota que estava com Erick chama a atenção dele e lhe entrega um celular. Erick pega o celular e vai para a área de fumantes da boate sem ao menos se despedir de Keysha. A garota fica sem graça, mas precisava elevar sua autoestima. Ela não poderia se rebaixar perante uma situação daquela.
Naquela hora, a lua brilhou através do vidro no teto da boate e o DJ colocou a música preferida de Keysha. A garota do cabelo rosa começa a dançar loucamente e começa a beber incontáveis copos de vodca. Muitos homens cercam Keysha e a garota dança alucinada. Minutos depois, o teto da boate começa a girar e Keysha desmaia.


.....


O dia amanhece e Keysha começa logo a acordar. Ela se vê deitada em um sofá de uma casa estranha. Aquilo ali não era a casa de seus pais. De repente uma fumaça vem em sua cara e a garota se levanta rapidamente.
-Cof! Cof!
-Relaxa, guria! To só na manha...
Keysha abre bem os olhos e vê Rody em sua frente. Logo, ela conclui que está em seu apartamento. O rapaz descaradamente fumava maconha perto da janela.
-Como é que eu vim parar aqui?
-Você alucinou. Bebeu e cheirou tanto que desmaiou lá na boate. Numa hora dessas, tu morre, guria!
-Valeu pela praga, Rody...
Keysha se levanta e se olha no espelho. Seus olhos estão bem fundos e seu cabelo desarrumado. A garota não dá a mínima e se prepara para ir embora daquele apartamento.
-Ei, onde você vai, Keysha?
Keysha não olha para trás e apenas segue o seu rumo saindo do apartamento de Rody.
Faz frio naquela manhã em Brasília. Keysha tenta se aquecer e se sente como um cão abandonado. Até os mendigos na rua pareciam estar numa situação melhor do que a dela. A garota pensa em Erick e se sente o pior ser do mundo.


Rodolfo Marques, mais conhecido como Rody, mora sozinho em um apartamento na 210 norte. Sua família é rica e seu pai é ministro. Ele nunca precisou trabalhar na vida e apenas curte a noite de Brasília como bem entende.
Rody vai até a casa de sua namorada na Asa Sul. Ele passa a tarde toda lá sem se preocupar com a vida e apenas escuta o que sua namorada tem a dizer. Rody não costuma a interagir muito com assuntos importantes que a sua namorada fala. Quando ela pede uma opinião dele, ele apenas disfarça e dá um beijo demorado nela.
A noite cai. Rody se despede de sua namorada e promete visita-la amanhã. O rapaz entra em seu carro e segue da Asa Sul para a Asa Norte. De repente, no meio do caminho, o rapaz se sente atraído e tentado a dar uma passadinha no Setor Comercial Sul. O que o atraía ali eram as damas da noite. Mas não eram simplesmente damas... São os personagens das esquinas... Se disfarçam de mulher e oferecem aquilo que um homem muitas vezes reprimido procura...
Rody vai andando devagar com o seu carro e observando todos os movimentos das travestis. Uma especial chama a sua atenção: vestida com quepe de policial, com uma jaqueta de couro e os seios à mostra... O rapaz fica louco e para o carro. A travesti entende aquilo como um sinal verde...
-Oi, chuchuzinho... – fala a travesti.
-Oi, boneca... Entra aí.
A travesti entra no carro e os dois seguem sem rumo pela noite.


A alguns metros dali, Khrysthyanne Andrielly observa Rody levar a sua colega de profissão para um programa. Ela então comenta com uma outra colega ali perto:
-Você viu a maricona que a Carla pegou?
-Eu vi, bicha. Aquele ali sempre ta marcando ponto aqui.
-Você já saiu com ele?
-Ainda não. Mas as bicha fala que o pai dele é montado na grana.
-Hum... boto fé. Será que a Carla vai dar o bote na maricona? A Carla costuma a assaltar...
-Sei lá. Ela só não pode queimar o nosso filme, senão daqui a pouco os home vão ta tudo revistando a gente e levando a gente presa.
-É...
As duas travestis continuam em seu ponto esperando algum cliente surgir. Khrysthyanne Andrielly lembra do dinheiro que está devendo para a cafetina da região e já pensa em assaltar algum cliente seu...


Chega sexta-feira à noite. Pedro Henrique é só um estudante de um curso de administração numa faculdade na Asa Sul. O seu sonho é crescer na vida, ter um bom carro, uma boa casa e passar em um concurso público. Ele é um rapaz de 24 anos comportado e meio careta para a sociedade, pois gosta de ser coerente e responsável.
Já são quase 21 horas e o professor de Pedro manda seus alunos para o intervalo. Um colega de Pedro chamado Nathan o acompanha e tenta persuadi-lo:
-Vamos, cara! Vai ser massa!
-Sem essa, Nathan. Eu vou ficar até o final. A matéria é importante e não dá pra ficar matando aula.
-Po, Pedro. Deixa de ser tão caretão ao menos uma vez na vida. Não pode matar aula uma só vez e ir pra boate?
-Pra você não ficar triste, eu te acompanho até o portão.
-Vamos logo então que a galera deve estar me esperando.
Pedro e Nathan seguem para o portão da faculdade. Nathan encontra seus amigos em um carro estacionado em frente à faculdade. Quando se aproximam, Pedro olha bem para o carro e se surpreende. Nathan olha para a expressão de espanto de seu colega e pergunta:
-O que foi, Pedro? Vai me dizer que mudou de ideia?
-Nathan... como é o nome daquela garota que está ali dentro do carro?
-Qual?
-A de cabelo rosa...
-Ah, o nome dela é Keysha...
-Keysha... - sussurra Pedro ao olhar Keysha no banco de trás do carro mascando chiclete e rindo.


(Continua no próximo capítulo, que será lançado na próxima semana! Aguardem!)


*Música que a Keysha escutou na boate (clique para escutar):


Moony - I Don't know why

1 comentários:

Tássia Aguiar disse...

Muito interessante!Porém, acredito que o texto pode ser mais poético, intenso visceral...falo na forma da escrita mesmo. Assim consegue chegar mais facilmente as nossas emoções.

Mas ambos estão de parabéns!Tenho certeza que essa história ainda vai dar o que falar! Adorei poder escutar a música que a menina de cabelo rosa ouviu na boate.