Capítulo 12 - Fera ferida


Capítulo 12 - Fera ferida


Rody se remexia ao som de uma batida forte. Olhava uma garota que dançava sensualmente e sentia que a noite ia render com a ninfeta. Erick estava perto e bebia vodca enquanto dançava com uma garota. Rody fecha os olhos e balança a cabeça. Ao abrir os olhos novamente e olhar para sua esquerda, ele para e fica estático. Seus olhos arregalados não acreditam no que veem.
-Não to acreditando que é ela! - pensa, sem saber o que fazer.
Keysha, Keith e Khrysthyanne Andrielly se aproximam. Erick parece não ter notado ainda a presença das garotas e segue dançando sensualmente com uma garota.
-Rody, olha quem eu achei no banheiro! - diz Keysha com entusiasmo.
-Oi, Keith. Beleza?
-Beleza, idiota!
O rapaz nem nota que Keith o provocou. Ele olha pra Keysha e finge não perceber que Khrysthyanne Andrielly se encontra em sua frente.
-Idiota, essa é uma amiga que acabei de conhecer, mas que já considero.
Rody olha para Khrysthyanne Andrielly com um pouco de receio e espera alguma atitude dela.
-Olá, coração! Tudo bem? Eu me chamo Khrysthyanne Andrielly, mas pode me chamar de Senhora Khrysthyanne Andrielly!
-E aí... beleza?
Ao esticar a mão para a travesti, o rapaz é discretamente puxado, como se Khrysthyanne Andrielly quisesse beijá-lo. Ao encostar em seu rosto, ela diz discretamente:
-Você por aqui, bicha?
-O que é que você ta fazendo aqui?
A travesti é irônica e dá um sorriso. Nesse momento, Erick se aproxima e é apresentado a Khrysthyanne Andrielly. Ao finalizar as apresentações, o rapaz passa o braço pelo ombro de Keysha, tentando abraçá-la, mas é brutalmente repudiado. Ele olha para a moça, que finge nada ter acontecido.
Todos começam a dançar agora mais lentamente. Eles fazem uma rodinha de amigos e se distraem olhando para o restante da boate. Keysha se distancia do grupo e vai para onde estava mais cheio. Ela lembra que veio para “causar” e dança loucamente rodeada por cinco rapazes.
-Bom, crianças, eu vou ali falar com umas amigas e daqui a pouco estou de volta! - fala Khrysthyanne Andrielly.
-Tá bom, amiga. Olha, eu adorei te conhecer, quero sair muito com você! - diz Keith.
-Claro, linda! Temos muito o que conversar. – diz a travesti, olhando para Rody.
O rapaz engole a atitude a seco.
Após Khrysthyanne Andrielly deixar a turma e se juntar às outras travestis que estavam em um canto da boate, Rody se sentiu mais solto. Mas não tão solto quanto antes.
-E aí, idiota! O que tá rolando de bom por aqui?
-Você, garota TPM! É a mais boa de todas!
-Babaca! Não sabe nem cantar uma mulher!
Após o comentário, Keith puxa Rody e os dois dão um beijo selvagem na pista. Keysha, que dançava alucinada, voltou sua atenção alguns segundos para a cena e fez uma cara como se quisesse dizer: “louca”.
Rody e Keith então “se pegam” durante a festa. Porém o rapaz não tira os olhos de Khrysthyanne Andrielly, que é sarcástica jogando beijos e piscando para ele. Após alguns minutos, ele sai das garras de Keith dizendo que vai ao banheiro. A moça o solta e, ao passar pelas pessoas, ele encosta a boca no ouvido de Khrysthyanne:
-Me espera na parada hoje.
A travesti finge não ter ouvido e continua fofocando com as amigas e dançando. Rody então volta para os braços de Keith, que finalmente deu uma trégua do asco que diz sentir pelo rapaz. Ele aproveita o momento.
Keysha deixa a pista de dança e vai ao banheiro aspirar um pouco mais de pó para ter mais barato ainda. A moça segue de volta entre a multidão, porém alguém segura seu braço:
-O que você quer? - grita.
-Puxa, guria, para de dar uma de difícil. - fala Erick, que ainda segura o braço de Keysha.
Rody beijava Keith, quando Nathan chega gritando:
-Ô Rody, a Keysha tá descendo o cacete no teu brother!
O DJ para a música e com isso dá para ter a noção do quanto a garota com seus cabelos rosa grita:
-Desgraçado! Vagabundo! Filho da Puta!
Erick permanece bêbado no chão, com as roupas rasgadas. As marcas de unhas se estendem por pescoço, braços e barriga.
Rody e Keith tentam tirar Keysha de cima do rapaz. Ela perdeu totalmente o controle e o ódio nos seus olhos são bem evidentes.
Após algumas tentativas, Rody consegue segurar Keysha. Keith e Nathan levantam Erick e o tiram dali. Ao passar por duas garotas, Keith consegue escutar:
- A Leila disse que não quis mais ficar com ele porque ele já chamou pro motel de cara!
-Não acredito! Deve ter chamado essa do cabelo rosa também!


No lado de fora, Rody decide que todos devem ir para a casa dele, para acalmar os ânimos. Porém, Keith diz que irá seguir com seu carro para casa. O rapaz não insiste. Nathan também segue com os amigos para outro rumo.
Em seu apartamento, Rody tenta estabelece um diálogo. Erick já se recuperou e Keysha parece ainda brava. O rapaz segue com o amigo para um quarto e o joga na cama.
-Keysha, pode dormir naquele outro quarto ali.
-Preciso tomar um banho. - diz a moça.
-O quarto é uma suíte. Divirta-se!
-Desculpa por tudo, Rody, mas é que o Erick é um idiota! Quero que ele morra!
-Relaxa. Olha só, eu vou dar uma saída agora, mas daqui a pouco to por aqui, beleza?
-Beleza. Vai lá.
-Tchau!
O rapaz desce o prédio um pouco tenso e segue com seu carro rumo à avenida W3 Norte. Perto das cinco da manhã, o rapaz observa que a cidade se encontra deserta. Somente algumas pessoas que, em sua maioria, são garotas de programa ou travestis. Faz frio e através do parabrisa ele vê uma neblina densa.
Ele para o carro na parada onde Khrysthyanne Andrielly faz seu ponto todas as noites. Ninguém por perto. O rapaz fica preocupado, mas decide esperar. Apenas barulhos de grilos cantando e alguns carros que esporadicamente passam na avenida. Após 22 minutos, o rapaz acende os faróis e decide ir embora. Ao olhar para frente, Khrysthyanne Andrielly surge com uma postura de diva.
-Olá, querido! Quanto tempo não?
-Nossa, você veio voando? Não vi você chegando!
-Claro, amor. Sou uma borboleta!
O rapaz sorri e abre a porta do carro. A travesti entra.
-Para lá nas bichas do Setor Comercial Sul e dessa vez te furo de verdade!
Rody sorri.
Os dois seguem para um lugar escuro e aproveitam bem o programa...
Alguns minutos depois, Rody e Khrysthyanne descansam e conversam um pouco:
-Então, quer dizer que agora você conhece minha brother, né?
-Pois é, colega! Você me achou, eu te achei!
- Eu não quero que fique de piadas comigo quando estiver na frente dos meus amigos. Se fizer isso, eu te mato!
-Noooossa! Com essa até o meu laquê desmanchou! To com tanta medinha de você, amor!
-Eu odeio você!
-Vou vender meu travesseiro de tão arrasada que fiquei! Te manca, bicha!
-Olha, eu não quero saber de problemas ok?
-Problema? Eu sou a solução, querido! E, falando sério, não me interesso nem um pouco por você. Eu te dou... você me paga... e pronto!
-Me beija!
Rody foi para cima de Khrysthyanne Andrielly, que o surpreendeu com uma bolsada na cara:
-O programa já terminou, filho! Me deixa na minha parada, me dá a grana e suma da minha vida!
-Você me enlouquece com essas coisas, sabia?
-Ô bem, toca essa carroça que tá na hora do meu sono de beleza!
O rapaz segue de volta. Ao parar na parada de Khrysthyanne Andrielly, ele a admira indo embora. Após pegar uma distância, a travesti olha pra trás e dá dedo para o rapaz. Ele sorri e continua observando.
De volta ao seu apartamento, Rody se encontra exausto. Pensa agora em toda confusão armada na boate. Durante o banho, ele pensa em Khrysthyanne Andrielly e em Keith. Lembra dos beijos na loira e na transa com a travesti, coisa acabara de acontecer. Ainda havia o cheiro dela em seu corpo. Seu perfume era forte e marcante.
Ao sair do banho, Rody se seca, veste uma roupa e anda pela casa procurando o que fazer. Foi uma noite muito intensa para simplesmente se deitar. Embora já fossem nove da manhã, o rapaz não estava cansado. Se sentia revigorado. Ele segue para a cozinha e faz café. Dá uma rápida lida no jornal enquanto degusta o líquido marrom.
Quando finalmente se dispõe a dormir, Rody passa no quarto de Erick para checar que está tudo bem. Ao abrir a porta, nota que a cama se encontra vazia. Apenas lençóis amarrotados.
-Não acredito que aquele pilantra foi embora daquele jeito! - sussurra.
Ele segue para o quarto de Keysha, enquanto decide se conta para a moça que Erick se foi, rasgado e machucado, ou se apenas checa se a moça também se foi. Ao abrir a porta do quarto, uma surpresa: Keysha se encontra nua na cama, enquanto Erick, também nu, a envolve em seus braços. Colocando a mão na boca para não fazer barulho com a surpreendente cena, Rody nota que Keysha permanece dormindo, porém, Erick abre os olhos e faz sinal de positivo para o amigo.
-Vagabundo... - diz Rody, em voz baixa.
Erick dá uma risada sarcástica.
Rody balança a cabeça sorrindo e fecha a porta.


>>>> (continua no final da semana!!!) <<<<

*Foto provisória!

**Música que tocava na boate na hora em que os amigos se encontraram:


Rihanna - Disturbia

Capítulo 11- Amores e acasos


Capítulo 11- Amores e acasos

Naquela semana, tudo parecia mais colorido, ainda mais quando o celular tocava. Lídia parecia não ter saído do dia em que conheceu Jorge. Sentia-se dentro do mesmo shopping, com as flores em sua direção e Jorge as oferecendo. Embora não tenha acontecido nada além de uma conversa naquele dia, a moça estava envolvida. E sentiu a mesma reciprocidade do rapaz.
-Eu merecia isso. E o Jorge também. - pensava Lídia.
Nem mesmo as investidas de Carolina em uma nova confusão abalaram as estruturas da apaixonada professora. Jorge sempre ligava no fim do expediente, e tudo parecia renovado, mais colorido. Carolina parecia não existir mais, isso frustrava a garota. E dava um novo fôlego na vida de Lídia. Mas essa lembrança do primeiro encontro não se tornava a única naquele momento.
Em um famoso barzinho na 406 Norte, com uma cerveja em sua frente e de olho no estacionamento, Lídia via seu amado descer do carro. A noite estava fria e o vento gelado balançava umas mechas de seus cabelos escuros. Mas a presença de Jorge trouxe calor àquele momento. Ela percebia todo o movimento do rapaz fechando a porta de seu carro, arrumando sua jaqueta e procurando-a. Quando seus olhos se encontraram, sorriram e então Jorge subiu as escadas do barzinho com mais confiança. Ele veio com um semblante tranquilo e receptivo:
- Demorei?
-Não. Acabei de chegar. Sente-se.
Jorge deu um beijo no rosto de Lídia, pegou a cadeira que estava em sua frente e sentou-se ao seu lado. As mãos de Lídia gelaram e seu coração batia forte.
- E aí? Como foi o seu dia?
- Foi tranqüilo. E o seu?
-Corrido. Estamos fazendo auditoria em uma conta bancária. Estamos desconfiando de lavagem de dinheiro. Mas o pai do rapaz que é dono da conta é poderoso. Por isso tem que haver cautela.
-Ah sim...
- Mas isso não importa. O que me importa agora é que estou feliz por estar aqui.
Jorge puxou e segurou o rosto de Lídia. Ela não ofereceu nenhuma resistência e a partir daí milhões de palavras foram ditas sem ser pronunciadas. Todo o desejo e felicidade dos dois se expressavam ali, diante de todos que estavam no bar. E eles estavam viajando. Juntos. Não foi um beijo qualquer. Foi um beijo guardado. Guardado há dias. E agora ele estava ali, unindo o que já estava unido. Dando certeza às impressões. Dando sentimento e calor à noite fria. O casal estava em uma outra dimensão. E nada mais importava naquele momento. Só o calor e o desejo. Lídia se sentia forte e invencível. Desejada. Jorge se sentia livre. E, em meio às pessoas, uma linda cena de um forte beijo se fazia presente.
Após o longo beijo, Lídia encostou sua cabeça no ombro de Jorge, que a abraçava, e disse, ainda ofegante:
- Obrigada por tudo. Você tem me feito muito bem.
- Eu que agradeço. Depois que eu te conheci, me sinto muito melhor. Você me transmite tranqüilidade de verdade.
Lídia sorriu.
Depois desse fato, os dois já agiam como namorados, mesmo sem ter havido o pedido oficial. Parecia não haver casal mais apaixonado naquele ambiente. Os dois se completavam e se olhavam com muito carinho.
Após algumas horas de conversa, se despediram com um beijo, e Jorge acompanhou Lídia até seu carro. Após vê-la partir, o rapaz pega seu carro e sai pela cidade, cantando uma música alegremente. Algumas pessoas estranham ao passar por ele, pois não contente em cantar, o jovem dança também. E as luzes do Eixo servem de palco para a apresentação. Seu carro vai deslizando na pista e o rapaz acena pra quem olha e aponta cantando a música, como se estivesse cantando para um fã. Ele se remexe no banco de uma forma engraçada, porém gostosa de ver.
E assim Jorge pega a estrada, rumo à sua casa. Até seu carro parece dançar.


A mesma música que tocava no carro de Jorge ecoa agora do quarto de Keysha. A garota está pronta para sair e Erick já ligou. A garota se balança ao som da música e pensa na noite que vem pela frente. Faz planos e se diverte imaginando inúmeras possibilidades. Chegando mais perto do espelho e caprichando na pesada maquiagem nos olhos, a garota lembra de Pedro, sentindo raiva devido ao último acontecimento.
-Babaca! - diz.
Quando a música acaba, a moça ouve batidas na porta:
-Keila! Estão te chamando!
-É Keysha, mãe! Avisa que eu to saindo! - grita a garota.
Após alguns minutos, tudo certo na checagem final de roupas, acessórios, maquiagem e cabelos, Keysha sai de dentro do quarto. Sua mãe se espanta por vê-la arrumada:
-Já vai pra gandaia?
Ela dá um beijo na mãe e vai saindo.
-Beijo, mãe. Daqui a pouco estou em casa.
Sua mãe se senta novamente de frente pra TV.
Keysha entra no carro, dá um selinho em Erick e fala com Rody, que está ao volante. Os rapazes vão na frente e a moça vai atrás, dando uma última conferida no batom e na maquiagem. No carro que os segue, está Nathan, uma moça e mais um amigo atrás.


Do banco da frente, Erick leva seu braço para o banco de trás e alcança a perna de Keysha. Ele olha para a moça e alisa sua perna. Ela apenas sorri e permite. Keysha olha as luzes da cidade. E isso a faz viajar. Não observa o caminho, apenas as luzes. Em sua cabeça passam milhões de pensamentos, e mais uma vez Pedro. Ela torce a cara e vê que Rody a observa.
-Hein, guria! Cadê a sua amiga revoltada? - pergunta o rapaz.
-Ela disse que talvez apareceria na boate hoje. Mas não é certeza, pois estava esperando a ligação do namorado.
- Ela curte um coroa, né?
Keysha fez que sim com a cabeça.
-O lance é grana! - exclama Erick.
-Mas isso eu tenho.
-Mas ela quer grana sem ter que transar pra isso! Há, há, há!
Keysha interrompe o papo:
-Olha só, vamos mudar de assunto? Não quero ver vocês falando da Keith na minha frente!
-Falou a dama ofendida! - provoca Rody.
-Ela é minha amiga, tudo bem?
-Perca seu dinheiro e vai ver se sobra um amigo...
Erick olhou sério para o amigo. Parece ter se sentido incomodado com o comentário de Rody.
-Que dinheiro eu tenho? – diz a moça.
-Mas você tem fama. Entra nos lugares de graça! Pessoas também sugam os populares.
Erick agora parece estar indiferente aos comentários.
Keysha se cala e continua observando as luzes que passam pelo caminho.
-Olha só galera! Vamos deixar de papo mole! Erick, bola um aí pra gente.
O rapaz se anima e prepara o cigarro de maconha.
-Vamos, galera, que a noite é nossa! - anima Rody.
Keysha olha pra trás e vê o carro de Nathan bem próximo.
-Esse seu amigo é gente boa, Rody! – comenta a garota.
-Keysha, o cara é brother!
-Imagino.
Eles fumam o cigarro de maconha e conversam sobre coisas triviais no restante do caminho.
Ao chegarem no escuro Setor de Oficinas Sul, estacionam o carro, descem e escoram no veículo, enquanto Nathan estaciona o seu. Rody levava algumas garrafas de Vodca e todos compartilhavam, entre cigarros.
Nathan desce do carro, parece animado:
-E aê, rapêize!
-Fala, Nathan! De boa?
-De boa.
Erick olha pra Keysha e, ao se virar para Nathan, pergunta com um tom irônico:
-E o rapazinho apaixonado da sua faculdade? Não trouxe ele pra dar mais um show pra gente?
-Ele tá apaixonado eu acho. Só vive atrás de uma menina de lá da facu.
Erick olha pra Keysha e vê que a garota sentiu um incômodo com a informação. Talvez para que Keysha esquecesse o que Nathan havia acabado de dizer, Erick a puxa e a beija. Todos fingem não ver e continuam conversando.
A boate estava lotada. Como sempre. Todos dançavam animadamente e o grupo de amigos foi adentrando o ambiente. Tudo parecia fazer sentido agora, com a magia dos neons agindo sobre seus corpos e a batida da música fazendo todos se sentirem muito animados. O celular de Keysha tocou e era Keith. A garota ainda tentou falar, mas não conseguiu ouvir o que a amiga dizia. Após alguns minutos dançando, eis que o celular vibra novamente. Ela vai a um lugar mais calmo e atende, mas sem sucesso. Não conseguia ouvir nada. Ao se voltar para sua turma, a moça de cabelos rosa repara que Erick dança voltado para uma garota. Ele parece já estar bêbado. Ela vê aquilo e começa a dançar sozinha. Nathan conversa com a moça que veio com ele. O amigo de Nathan está no bar comprando bebida. Rody dança como um louco. Keysha aproveita a distração de todos e cumprimenta as pessoas que conhece no ambiente.
As pessoas fazem questão de Keysha. Conversam com ela, chamam-na para estar por perto. Mas a garota sempre recusa. Raramente da o ar da graça para alguma turminha que a admira. Geralmente está com Rody e Erick, ou Keith. Por falar em Keith, o celular parou de tocar.
-Acho que ela ligou pra avisar que não vem. – pensou Keysha.
Mais uns minutos dançando e abraçando algumas pessoas e ela decide ir ao banheiro dar uma checada na maquiagem. Sai em meio à multidão, esbarrando em uns e desviando de outros. Todos estão eufóricos.
Ao adentrar o banheiro, a moça para em frente ao espelho e observa que a maquiagem do olho esquerdo está um pouco borrada. Ela chega mais perto do espelho para ver melhor. Eis que Keith sai de dentro de um dos box:
-Ah, safada! Eu to que ligo no seu celular!
-Oi! ,Caramba tava o maior barulho! Eu não te ouvia!
As duas se abraçaram.
-Vamos, Keith, os meninos estão aí.
-Vamos, amiga.
Ao passar da porta do banheiro, Keith segura a amiga:
-Amiga, só um momento que eu to com uma amiga que conheci aqui! Ela é super gente boa.
-Ah, beleza!
-Olha ela ali no bar. Vamos lá.
Keysha observa a nova amiga de Keith e vê pelas roupas e pela altura, que não se trata exatamente de uma mulher:
-Aqui estamos! - diz Keith.
-Oi! Eu sou a Keysha! Tudo bem?
-Oi, linda! Prazer, eu me chamo Khrysthyanne Andrielly, ao seu dispor.
Keysha sorri.


>>>>(continua no final dessa semana!)<<<<<

*Na foto, o mais novo casal romântico de Brasília: Jorge e Lídia!

**Música que animou Jorge após seu encontro com Lídia:

Led Zeppelin - Immigrant Song

Capítulo 10 - Reflexões, realidade e afins


Capítulo 10 - Reflexões, realidade e afins


Durou em média dois minutos do momento em que seus olhos se encheram de lágrimas até o choro sentido. Vendo aquele vídeo, Luciana se compadeceu com uma situação que não tinha visto com tanta veracidade e sentimento antes. No refrão, as crianças africanas cantavam com muito sentimento. Nesse momento, Luciana pediu perdão a Deus por todas as vezes que reclamou da vida. Tudo parecia tão pequeno diante daquelas imagens. Sua atenção se dividia entre a emoção do vídeo e o medo de alguém adentrar a sala de informática e vê-la chorando. Doía ver aquelas pessoas, que possuíam a mesma cor de pele sua, morrendo de fome, catando comidas no chão, chorando com seus filhos magros pendurados em seus corpos.
Pedro entra na sala e avista a cena. Para por alguns instantes e vai em direção à moça:
-Ei, moça, tá tudo bem?
Luciana faz sinal e Pedro se senta. Sem dizer nada, ela volta o vídeo e o rapaz assiste. A cada imagem seus olhos ficam mais atentos e mais úmidos. Nesse momento, ele pensa em Keysha e no quanto é egoísta com todo esse sentimento. Não entende nada sobre dor, sobre problemas. E sentiu vergonha por ter saúde e por viver nesse mundo tão injusto. Mas foi no momento em que o vocalista cantou “Heaven’s cry, Jesus cry” que o rapaz não se conteve. Luciana o abraçou e, ao se olharem, souberam que, por mais singelo que fosse aquele momento, seria inesquecível e que dali algo maravilhoso nasceria.
Passado o momento de lágrimas, com a cabeça no colo da moça, Pedro, com voz chorosa, diz:
-Qual é seu nome?
-Luciana, e o seu?
-Pedro.
Silêncio.
Passados alguns minutos os dois se levantam e saem juntos da sala. Ainda nos corredores, discutem sobre a situação social e política da África, sobre o massacre de Ruanda, e sobre várias outras coisas que envolvem o continente.
-Tenho uma amiga que só reclama da vida, de tudo. Nada tá bom pra ela. Ela deveria ver isso.
-Luciana, as pessoas têm essa mania. Só dão valor ao que não tem.
-Temos que rever nossos conceitos né?
-É.
-Pedro, foi um prazer enorme te conhecer.
-O prazer foi meu.
Os dois trocam beijos no rosto, telefone e saem para suas salas mais aliviados e felizes por terem se conhecido. Pedro viu em Luciana uma grande amiga em potencial. Luciana não tinha pensado nada até o momento. As fotos e a música ainda ocupavam todo o espaço de sua mente.
Luciana é uma garota de classe média-baixa, que reside na cidade satélite de Samambaia. Conheceu o trabalho desde cedo, dividia sua tarefas com muito esforço e sempre alcançou seus objetivos, mesmo conciliando trabalho com estudo. Sempre fora assim, desde que se entende por gente. Tem cinco irmãos, quatro homens e uma mulher. Seus irmãos não pensam em progredir profissionalmente e não ajudam em casa, então ela sempre soube o que é ter responsabilidade. Sendo solidária à mãe, apesar de cobrar acirradamente uma postura mais protetora da parte dos irmãos, sempre segurou as rédeas enquanto esperava esse milagre acontecer. Mas até mesmo essas dificuldades pareciam não ser nada diante do que havia visto a pouco.
Pedro ainda pensava no acontecimento interessante, porém, dividia suas atenções entre os pensamentos e a aula. Fora isso ainda havia o fato que se passou na orla do lago Paranoá, no qual, por um lado positivo, Nathan havia se aproximado mais do rapaz, porém ele sabia que ia ter que encarar Erick, Rody e... Keysha! Como isso o torturava! Como pôde colocar tudo a perder? Uma pequena parte dele sentia alívio, por ter sido espontâneo, mesmo bêbado. Mas a maior parte sentia vergonha. E medo. Medo daqueles cabelos rosa e da áurea que fez a Keysha se apossar da doce Keila. Seus pensamentos agora iam para Luciana. E para a África. voltavam para a Orla. E assim foi até que a viagem foi interrompida pelo professor:
-Então, prova na próxima aula.
-Putz! - Pensou.


Já eram dez da noite quando as últimas lojas da quadra 407 da Asa Norte fechavam suas portas. Porém o trânsito ainda estava frenético. Alguns ambulantes se encontravam na fria noite, com seus casacos e toucas, atendendo os clientes e tentando se aquecer com as mãos no bolso. Havia ali um quiosque que vendia churrasquinhos, onde alguns moradores e funcionários de empresas ao redor iam acompanhados e seguindo aquele cheiro, que parecia irresistível. Eles conversavam entre si sobre o clima e outras coisas. Alguns observavam a conversa dos outros e a noite seguia. Keith, de seu quarto, observava toda a movimentação, enquanto pouco se importava com o que passava na TV, que se encontrava ligada. Observando coisas simples que as pessoas faziam, seu pensamento vagava sobre o que é e sobre o que poderia ter sido. Por um momento, imaginou seu pai por perto, enquanto via um homem com seu bebê passando na avenida. Quem seria ele? O que teria acontecido? O que seria verdade em toda a sua história e o que não seria? Sua mãe, que agora se encontra internada em um hospício não muito longe dali poderia ter lhe faltado com a verdade durante seus relatos. Ou talvez não. Ou talvez ela sempre fora “louca”. Ou talvez tenha enlouquecido com as pressões da vida. Tudo parecia muito incerto e impossível. Chegou por um segundo a pensar em desistir da vida que leva e tentar ser ela mesma. Simples.
-Devo estar ficando louca!
Reginaldo era seu namorado. Mas o que na verdade Keith buscava naquele senhor, de barba branca e com cabelos ralos era uma proteção de pai. Uma proteção que jamais conhecera. E por não ter tido presença masculina em sua criação, não confiava em homens. E admirava a força das mulheres. Falando em mulheres, que incógnita! Desde que sua mãe foi internada, a moça foi visitá-la umas três vezes. A última tem mais de dois anos. Então, ao pensar nisso, via as mulheres com força e fraqueza ao mesmo tempo. Apreciava o fato de dominar os homens justamente por não se deixar envolver por completo. Quantos já haviam chorado ao seus pés?
Tirando o esmalte da unha e ainda recostada na janela, a moça pensou em todos os homens que amou em silêncio, e em todas as mulheres também. Todas as vezes que esperou e nada aconteceu. E nas vezes em que não esperou e algo mudou sua vida. Ela desvia a atenção da unha e consegue ver seu carro, um presente de Reginaldo, no estacionamento.
-Ai, chega de pensar bobagens!
Deitou-se.


-Como a água de Brasília é diferente! - pensou Anderson enquanto dava um gole em frente à geladeira, no meio da noite. Os rapazes que dividiam o apartamento com ele roncavam quebrando o silêncio do local. Conseguia ouvir também algumas pessoas transitando pelos corredores do prédio. Se deitou e refez toda a cena da festa em sua mente. Cogitando todas as possibilidades e até mesmo a mais corajosa: sendo bem direto com Jéssica. Mas o que tem foi o que aconteceu de fato. E não sabia qual reação a garota teria da próxima vez que o visse. Esperava que ela fosse compreensiva e continuasse sendo cortês com ele. Mas também havia a possibilidade de ser ignorado pela moça. Recém-chegado na cidade, Anderson tinha receio da aceitação das pessoas, visto que não sabia como era o comportamento típico das pessoas dali. E quanto mais amigos fizesse, mais poderia compreender tudo, uma vez que tem uma personalidade extrovertida, porém sempre cautelosa. Mas a moça tinha sido tão bacana e receptiva com ele. Isso o deixava com dor na consciência, que só passou quando um pensamento válido tomou conta dessa questão: justamente por ela ter sido tão bacana, ele deveria, mais do que nunca, agir com sinceridade com ela.
-Arre égua! Que povo diferente! - pensou, enquanto ouvia o ronco dos amigos.
O rapaz pensou nos costumes de sua região natal, dos amigos que conquistou, sua família. Relembrou momentos que se passaram, comparando a atitude de Jéssica com prováveis atitudes de outras pessoas que conhecia. Começou a cogitar milhões de situações e pessoas no mesmo ambiente, revisitou os locais de Brasília em sua mente, até que adormeceu.


Para muitos, pouco tempo se passou, mas para Khrysthyanne Andrielly durou muito tempo até que se estabeleceu no ponto onde se encontrava agora. Foram muitos dias forçando a barra com Rebecca e Jennifer, para conquistar a amizade delas e dividir a parada de ônibus na 714 norte. Até isso acontecer ficava perambulando sem um ponto fixo. Isso faz com que os clientes sejam mais escassos. Com isso o dinheiro vai faltando e as contas tirando cada vez mais seu sono. Mas todo esse pensamento saiu de sua cabeça quando, sentada na parada, a travesti admirou sua bota preta de couro, que ia até o meio da coxa, combinando perfeitamente com o micro vestido, também de couro preto. Ela se sentia confiante com o traje e não se importa com o frio e os fortes e gélidos ventos que assoviam em seus ouvidos. As árvores da avenida balançavam seus galhos freneticamente e exalavam um cheiro agradável, que tomava conta da avenida. Khrysthyanne Andrielly emanava confiança e petulância para os carros que passavam, jogando beijos e fazendo poses. Por um momento ela se olha no espelho para retocar a maquiagem:
-Gostosa! - disse para si mesma.
Enquanto retocava o batom com muita concentração, um carro se aproximou com os faróis altos e em baixa velocidade. Khrysthyanne se aproxima, e ao abaixar na janela, se surpreende com o motorista:
-Eu sabia que ia te achar de novo!
Rody dá um sorriso sacana e a travesti se anima:
-Quem é vivo sempre aparece, né, bicha?
-E aí, ainda tá o mesmo preço?
-Pra você é mais caro, amor, porque tem muita emoção e risco!
-É assim que você gosta que eu saiba!
-Já disse que quero morrer velha e linda!
-Linda você já é...
-Colega, eu não estou nessa parada esperando meu grande amor, vamos ao que interessa?
-Entra aí.
Khrysthyanne faz um ar de superior e adentra o carro, que segue a avenida W3 Norte rumo à rodoviária. Após alguns minutos, Rody quebra o silêncio do carro:
-Tava pensando em um programinha a três, você tá afim?
-Querida, aí a grana vai ter que ser dobrada! Se for com aquela bicha motoqueira da última vez, eu triplico o preço!
-Relaxa, vai ser legal.
Rody pega na coxa de Khrysthyanne e aperta com sofreguidão. O rapaz está animado com o fato de estar com a travesti e mais uma pessoa:
-Essa noite promete!
-Estou tão empolgada... - fala a travesti com desinteresse.
Khrysthyanne Andrielly agia como se pensasse: “que horas isso vai terminar?”. Porém essa atitude logo mudou quando Rody faz o retorno e desce para o Setor comercial Sul. Ele aumenta os faróis e adentra o setor. Khrysthyanne fica imóvel por alguns segundos sem acreditar no que está acontecendo, porém é preciso alguma atitude rápida, pois ao avistar Carla, a travesti do quepe de policial, Rody diminui a velocidade.
-Fodeu! - sussurra a travesti.
Vendo que a velocidade do carro está diminuindo e que Carla se aproxima entre os altos faróis do carro, a travesti tira um canivete da bolsa e encosta da barriga do playboy:
-Ou você arranca com essa lata velha daqui, ou vai virar purpurina!


>>>> (continua na próxima semana!!!) <<<<

*Na imagem, Keith em uma das entrequadras da Asa Norte!

**Música que tocou profundamente Pedro e Luciana:

Wyclef Jean - A Million Voices

Capítulo 9 – O amor está no ar!


Capítulo 9 – O amor está no ar!


Os dias frios vão chegando lentamente a Brasília. As noites são mais longas e o início desse período conta com chuvas muitas vezes pesadas que costumam a alagar algumas partes da cidade. Não é difícil ver pessoas saindo de casa para o trabalho com suas jaquetas ou blusas de frio, tirando ao longo do dia e voltando a usar no início da noite. O frio contrasta com o tempo seco e pessoas mais vulneráveis sentem os efeitos na pele como boca ou pés rachados.
Pela manhã, Lídia sai com antecedência de sua casa na Ceilândia e logo enfrenta um engarrafamento na via Estrutural. Os engarrafamentos do Distrito Federal são pequenos comparados a outras grandes cidades do Brasil, mas mesmo assim trazem dor de cabeça às pessoas. Depois de alguns minutos perdidos por causa de um pequeno acidente com moto, a professora de português pôde seguir caminho para a escola em que dá aula na Asa Norte.
Ao chegar na escola, a professora apressa-se. Já descendo do seu carro e mal fechando a porta, ela corre até a sala dos professores no térreo da escola, pega seu diário, seu apagador e seu giz e corre para a sala. Hoje é dia de prova para os alunos da 8ª série. A turma de Carolina, a aluna que não vai muito com a cara de Lídia, terá prova de orações subordinadas.
-Bom dia, turma. Arrumem as carteiras e tirem todos os materiais, deixando apenas lápis, borracha e caneta. Vocês vão ter esses dois horários para poderem fazer a prova. Está super fácil!
Após o aviso, Lídia abre sua pasta e começa a distribuir as provas. Após entregar a última prova, ela fala:
-Boa sorte!
A professora volta ao seu lugar e senta-se para preencher o diário. Após os dez primeiros minutos de prova, Carolina ainda não resolveu nenhuma questão e tenta olhar para a prova de sua colega ao lado. Ela aproveita a distração de Lídia e consegue colar as questões um e dois. Ao tentar olhar para a terceira questão, ela se assusta com a advertência da professora:
-Eu estou vendo cochichos e pessoas tentando colar... Vamos ter postura e saber que fazer prova não é algo mecânico... mas sim pra vida!
Carolina faz uma cara de decepção e até mostra o dedo para Lídia quando esta estava distraída. A aluna volta a olhar para a prova de sua amiga. Lídia pega o ato em flagrante desta vez:
-Carolina, a sua prova está na sua frente. Concentre-se nela.
A aluna se sente incomodada com aquilo e começa a colar na frente de Lídia. A professora se sente humilhada com aquela situação e decide se levantar. Ela vai até a carteira de Carolina e fala:
-Eu estou te pedindo, por favor, pra você não colar.
-Professora, volta pra preencher o seu diariozinho e me deixa em paz!
Os olhos de Lídia começam a lacrimejar e, num gesto de raiva, ela tira a prova da carteira de Carolina.
-Eu... eu vou falar pra direção da sua indisciplina, Carolina.
-Me devolve essa prova agora!
Os alunos param de se concentrar na prova e observam a histeria de Carolina. Todos ficam espantados com a atitude da colega de classe.
-Eu vou chamar o meu pai aqui! Você não tem esse direito! Devolve minha prova, sua doida!
Lídia começa a chorar com aquela situação e caminha para resolver o assunto com a diretora.
Passando-se alguns minutos, Carolina chega à diretoria onde Lídia e a diretora a esperam.
-Sente-se, Carolina. Eu quero saber o que houve.
-Diretora, a professora Lídia me maltratou e pegou com força no meu braço só porque eu olhei para o lado. Ela achou que eu tava colando e pegou a minha prova!
-Mas eu... – tenta Lídia se explicar, mas seu choro não a deixa.
-Isso é verdade, Lídia?
Lídia seca as lágrimas e, quando ia falar, o pai de Carolina chega na porta da direção. A professora se espanta com aquilo e observa que sua aluna é capaz de tudo.
-Eu vim saber o que houve com a minha filha! – fala o pai, cheio de autoridade.
Carolina se levanta e abraça o pai. Ela faz um falso choro:
-Pai, eu juro que não estava colando... eu juro!
-Você não me explicou direito por celular, filha. Mas eu vou processar essa escola e a professora por danos morais!
-Tente se acalmar, senhor. – fala a diretora – Tudo não passou de um mal entendido. Nós vamos deixar a Carolina continuar fazendo a prova numa sala separada. Ela não será penalizada.
-Assim espero!
O pai de Carolina a abraça e a chama para conversar em particular. A diretora chama Lídia, que estava chorando, e adverte:
-Tenha cautela da próxima vez em que for acusar um aluno. Não podemos deixar que essa gente deixe de freqüentar nossa escola!
Lídia se sente abandonada naquele momento e tenta disfarçar seu choro. Suas mãos tremem e ela procura um calmante em sua bolsa enquanto decide se levantar e lavar o rosto no banheiro.


Anderson chegou ontem à Casa do Estudante Universitário na UnB e nesse momento arruma sua bagagem na moradia. Junto com ele, mais dois rapazes dividem o apartamento no bloco B. Anderson organiza suas camisas enquanto os outros dois estudantes navegam na internet no notebook.
-Aqui em Brasília faz frio. Acho que eu vou ter que comprar blusa depois ah, ah, ah.
Os dois estudantes não olham para Anderson e continuam calados.
-Lá em Recife é tão quente que o calor daqui é fichinha pra mim. Minha mãe é que disse que eu vou sofrer nos primeiros meses. Meu pai riu desse comentário dela e falou para eu ser um “cabra macho”. É... acho que eu vou me acostumar... Vocês estão aqui há quanto tempo?
O silêncio se faz após a pergunta de Anderson. O calouro da universidade para um pouco e observa seus colegas de quarto. Parece até que eles fingiram que não escutaram.
-Ei, vocês dois! Vocês estão aqui há quanto tempo?
Apenas um se vira rapidamente pra responder, sendo bem curto:
-Três anos.
-Ah, ta... Achava que o gato tinha comido a língua de vocês. Pelo que vi, vocês, candangos, não costumam a falar muito.
-Ninguém aqui é candango. Somos do Paraná. E não chame os que nasceram aqui de candangos. São brasilienses. Eles não gostam.
-Ah, ta.
Anderson fica um pouco sem graça com aquela resposta meio estúpida do seu colega de quarto. Ele então continua:
-De qualquer jeito, acho que os brasilienses são muito frios. Não fazem amizade tão facilmente.
Anderson então entra no banheiro. Os dois rapazes se olham e balançam a cabeça. Nesse momento, uma universitária bate na porta. Um dos rapazes se levanta e abre.
-Gente! Ta rolando uma festa no “apê” da Pri. Ela ta convidando todo mundo! Bora? – fala a moça.
-Não sei...
-Deixem de ser morgados! Ta mó barato!
Nessa hora, Anderson sai do banheiro e a moça o avista.
-Vocês agora têm companhia?
-Opa, olá. Eu me chamo Anderson.
-E eu me chamo Jéssica. Tu é novo aqui, mas pode ir com a gente. Vamo se enturmar!
-Ir pra onde?
-Tá rolando uma festa aqui no segundo andar. Vamo!
Jéssica acaba convencendo os três a saírem do ambiente monótono e irem para a festa. Os dois colegas de moradia vão mais atrás e Jéssica segue com Anderson na frente.
-E aí, já conseguiu se enturmar com a galera?
-Eu to tentando, mas ta difícil. O povo daqui de Brasília parece que não gosta muito de amizade.
-Ha, ha, ha... o lance é que as amizades aqui surgem nos grupinhos, nas famosas “panelinhas”. Se você chega de repente, o povo estranha. Mas desanima não. Vamo lá pra conhecer a galera!
Jéssica pega na mão de Anderson e isso o deixa mais confiante. Isso sem mencionar o fato de a garota ter achado o calouro muito bonito. Ao chegar no apartamento de sua amiga Priscila, Jéssica já faz questão de apresentar os convidados. Anderson, no início, fica meio tímido, mas depois começa a se soltar. A música está alta e os universitários só pensam em dançar. Claro, não podia faltar bebida e todos se deliciam com um saboroso vinho. Há bebidas mais fortes, mas Anderson rejeita. O rapaz começa a despertar interesse em Jéssica com a sua habilidade de dançar.
Depois de algum tempo, Anderson se cansa e senta-se ao lado de Jéssica.
-Ha, ha, ha... que galera divertida. Tem razão, Jéssica. Acho que só assim que eu conheço melhor os cand... digo, brasilienses!
-É verdade. Deve ser “froids” se sentir meio sozinho...
-Ah, mas eu não tenho dessa não. Quem quiser chegar pra conversar comigo, se dá bem. Sou muito aberto. Adoro conversar!
Anderson bebe um pouco e Jéssica deixa se mergulhar no profundo azul de seus olhos. Ela sentiu algo diferente no primeiro contato com o rapaz. Seus pensamentos começavam a se agitar e os impulsos de seu corpo a queimavam por dentro. De repente, surge a hora perfeita: os universitários colocam uma música bem romântica para lembrar os velhos e bons anos 80.
-Vem, vamo dançar.
Jéssica puxa Anderson e os dois começam a dançar a música lenta. A garota deita sua cabeça no ombro do calouro e ele fica sem entender nada. Nesse momento, Jéssica concentra seu olhar bem fundo nos olhos de Anderson. Sua boca tenta se aproximar da dele... Anderson fica meio nervoso e desconsertado. Jéssica tenta aproximar seus lábios da boca do rapaz e ele tenta sair, mas ela o segura com os braços em volta de seu pescoço.
-Não, espera! – fala Anderson.
-O que foi? Não seja tímido...
Jéssica força a situação e encosta seus lábios nos de Anderson por meio segundo. O rapaz a tira com força.
-O que foi? – fala a garota meio espantada.
Anderson respira fundo e fala:
-Preciso ir! Eu não liguei em casa até agora! Meus pais devem estar preocupados.
Anderson deixa Jéssica só e sai da festa.


A tarde vai cedendo lugar para a noite em Brasília. A avenida W3 começa a ter seu trânsito intensificado por causa do final do expediente, alunos saindo da escola, alunos descendo na parada da faculdade, pessoas indo embora pra casa depois de um dia cansativo de trabalho... É nessas horas que as artérias da cidade mostram mais vida do que nunca.
Nesse momento, Keysha chega em casa após ter aula de inglês. Ela faz pouco barulho e já corre logo para o seu quarto. A garota de cabelos rosa tem uma surpresa ao chegar em seu quarto e ver sua mãe arrumando algumas coisas. Até escada perto do guarda-roupa tinha.
-Que bagunça é essa aqui no meu quarto?
-Oi, filha. Eu tava limpando em cima do seu guarda-roupa.
-Não precisa disso, mãe. A senhora sabe que eu não gosto que mexam nas minhas coisas!
-Olha o respeito, Keila! Pra dizer a verdade, eu fui procurar essa caixa aqui. Estava toda empoeirada.
-E o que tem nela?
-Fotos antigas. Tem até foto do meu casamento. Foto sua pequenininha na escola... foto sua no teatrinho da escola... Várias recordações!
-Ai, que horror! Eu não quero ver isso.
A mãe de Keysha pega um álbum e começa a passar suas fotos. É um álbum de fotos da formatura da quarta série.
-Olha como você tava mais bonitinha. Seus cabelos castanhos claros realçavam mais a sua beleza... Lembro que a professora te elogiava porque você tirava as notas mais altas da classe! Era tão educadinha. Você até brigou com uma coleguinha sua... ela tinha cortado seu cabelo com uma tesoura... Ah, essas crianças!
Aquelas lembranças viam à tona na mente de Keysha e feriam o seu ego com pedaços de vidro afiados. Relembrar coisas do passado a tornavam frágil, enfraquecia a estrutura sólida e o muro em volta de si que ela construiu. Aquilo não poderia retroceder!
-Aaaaaahhh!!! – grita Keysha.
A garota de cabelos rosa tem uma crise de surto e derruba os álbuns no chão. Sua mãe se assusta com aquela atitude:
-O que houve? Você está bem, Keila?
-Eu gosto que me chamem de Keysha!!!
-Esse não é o seu nome! É só um apelido! Por que fez isso?
Keysha tenta se acalmar e respira fundo:
-Eu to precisando ficar só, mãe!
Sua mãe a olha estranho.
-Recolha isso do chão! Depois eu quero uma explicação pra isso tudo!
A mãe de Keysha sai do quarto. A garota fecha a porta e respira fundo. Ela passa a mão em sua cabeça e olha os álbuns de fotografias que ela derrubou.
-Vou recolher isso porque eu não quero ficar vendo!
Keysha recolhe os álbuns e os amontoa de forma desorganizada. De repente, uma foto escapa do álbum. A garota pega e vê uma foto sua da oitava série. Ela e mais duas amigas. Ao olhar para o fundo, Keysha reconhece a pessoa... Era Pedro...


Horas depois, Lídia deixa a escola depois de um dia estressante de trabalho e se dirige ao shopping Pátio Brasil, na Asa Sul. Ela prefere estacionar dentro do estabelecimento, pois está frio lá fora. Ao chegar perto do elevador, a professora de português lembra-se de que tinha que ir à praça de alimentação. O estresse com a aluna Carolina a deixou com sentimentos e memórias confusas.
O elevador chega ao andar da praça de alimentação e Lídia tenta encontrar o lugar certo... Ela começa a ficar nervosa quando pensa no real propósito de estar ali. Então, alguém atrás dela a chama:
-Oi, “Professora Carente”.
Lídia olha para trás e dá um sorriso ao ver Jorge com um buquê de flores.



>>>> (continua no final dessa semana!) <<<<


*Na imagem, Lídia no shopping!

Música dos anos 80 que os universitários da UnB curtiam enquanto Jéssica e Anderson dançavam juntos:

Withisnake - Is This Love